As sete maiores mentiras do currículo
Dar informações falsas para conseguir um emprego é uma tentação e
um erro. Os casos mais comuns, como os especialistas os desmascaram
e como aumentar suas chances sem cometer deslizes éticos
DETETIVE
A consultora de RH Juliana Marotta, da Manpower. Os
selecionadores são preparados para desmascarar mentiras de
candidatos
De cada dez currículos que chegam às empresas, quatro têm
informações distorcidas. E outros dois contêm mentiras deslavadas. A
conclusão é da empresa de investigações Kroll, que presta serviço de
análise de currículos para companhias, depois de analisar os dados
de candidatos a emprego de nível gerencial para cima. A maquiagem
curricular não é exclusividade brasileira. Nos Estados Unidos, a
taxa de invenções destinadas a impressionar contratantes é bem
parecida, segundo análises independentes do site Career Building e
da consultoria Accu-Screen, especializada em vasculhar referências
de candidatos a emprego.
O problema deverá crescer com o acirramento da competição por
empregos. Desde o início da crise econômica, no final do ano
passado, o Brasil fechou 700 mil vagas de emprego formal. E muita
gente que se sente ameaçada já está tratando de procurar
alternativas. A Manpower, empresa especializada em recrutamento,
registrou um aumento de 50% no número de currículos recebidos. Numa
situação assim, cresce a pressão para se destacar dos concorrentes
e, conseqüentemente, a tentação de mentir ou exagerar no currículo.
Não vale a pena.
Especialistas afirmam que mentir para arrumar emprego é um equívoco,
em tempos de crise ou não. “Mentir pode garantir mais entrevistas,
mas não garante emprego. Na verdade ajuda a afugentá-lo”, afirma o
colunista de ÉPOCA Max Gehringer. Uma mentira, por mais “inocente”
que seja, deixa o candidato numa situação constrangedora e quase
sempre acaba eliminando suas chances de obter o emprego. “Para um
selecionador, se o candidato mente na porta de entrada, é bem
provável que continue mentindo”, diz Lizete Araújo, vice-presidente
da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH).
É raro uma lorota relevante se manter de pé depois de um escrutínio
do entrevistador. Em geral, ele é um profissional treinado para
explorar as contradições entre o que está no papel e a fala do
candidato. “Diante da capacitação que o pessoal de RH está
adquirindo, é ingenuidade achar que dá para levar uma mentira
adiante em uma entrevista”, afirma Carlos Eduardo Dias, sócio da
Asap, empresa especializada em profissionais em início de carreira.
Nas entrevistas, cada tópico listado no currículo é destrinchado
pelo selecionador. Uma hesitação maior ou uma pequena incoerência já
são um alerta de que aquele ponto é duvidoso.
Após a entrevista, os aprovados ainda passam pela peneira da
checagem das referências uma tarefa cada vez mais minuciosa em
departamentos de RH e consultorias. “Hoje em dia, os selecionadores
já têm conhecimento técnico para avaliar candidatos de setores muito
específicos”, afirma a consultora Juliana Marotta, da Manpower. Ela
é responsável pela checagem de currículos de aspirantes a vagas no
setor de tecnologia da informação.
Os principais “maquiadores de currículo” são os jovens em início de
carreira. Carentes de experiência, eles tendem a engordar seus CVs
copiando modelos prontos, que geralmente pecam pelo exagero. Entre
os candidatos a cargos mais graduados, como o de gerentes ou
diretores, o risco de mentir é muito alto, até porque as empresas
costumam investir mais na checagem. “Uma contratação de alto
executivo é um investimento estratégico e delicado, por isso os
cuidados de segurança são altos”, afirma José Augusto Minarelli, que
há 26 anos ajuda executivos demitidos a arranjar emprego. Isso não
significa que não haja mentiras nos altos escalões. Em 2007, Marilee
Jones, a reitora da mais renomada universidade de tecnologia dos
Estados Unidos, o Massachusetts Institute of Technology, pediu
demissão. Motivo: descobriram que ela havia listado três cursos de
especialização que não cursara.
É óbvio que a peneira dos selecionadores não identifica todos os
mentirosos. Porém, mesmo os que conseguem vaga têm de conviver com o
risco de ser desmascarados a qualquer momento, com conseqüências
sérias para sua imagem profissional. Sem contar o drama de
consciência por ter mentido. A seguir, as sete mentiras mais comuns,
mencionadas por uma dezena de recrutadores e consultores, e as
técnicas para detectá-las.
1. Idiomas - É a mentira mais popular. Trata-se daquele inglês
“básico” que no currículo se torna “avançado”. É também a mentira
mais fácil de ser identificada. Ocorre principalmente em seleções de
jovens profissionais que não esperam uma avaliação rigorosa de seu
domínio de idioma estrangeiro. Um simples teste ou uma conversa com
o recrutador são suficientes para desmascarar o monoglota.
2. Qualificação – Inventar uma especialização técnica ou
transformar um curso rápido em pós-graduação também são manobras
muito comuns e fatais – nos processos de seleção. Além da questão
moral, se a fraude é descoberta, leva à dúvida sobre todas as
competências que o candidato afirma ter. Essas mentiras são
normalmente descobertas na entrevista, quando o recrutador pede
detalhes dos cursos realizados nome dos professores, das disciplinas
etc. Se o candidato conseguir manter a farsa, ele ainda pode ser
desmascarado quando checadores ligam para a universidade para
conferir as informações. Algumas empresas são mais diretas: exigem o
certificado dos cursos.
3. Cargos e funções - Muitos candidatos mentem sobre cargos em
empregos anteriores para demonstrar experiência ou pleitear salário
mais alto. Assim, um estagiário pode virar assistente, um supervisor
vira gerente, e por aí vai. São dados de checagem relativamente
fácil quando a entrevista é bem feita: o candidato costuma
escorregar nos detalhes sobre seu passado profissional.
4. Participação em projetos – Esse tipo de mentira, relacionada a
conquistas e projetos implementados em empregos anteriores, exige um
esforço maior do recrutador. Por causa do passar do tempo e da
rotatividade das empresas, muitas vezes é difícil entrar em contato
com antigos colegas do projeto mencionado. Segundo Max Gehringer,
esse problema começou a surgir nos anos 1980, quando passaram a
circular currículos em primeira pessoa. “O currículo com as palavras
‘liderei’ ou ‘coordenei’ é complicado porque são ações difíceis de
ser mensuradas e com resultados muitas vezes subjetivos”, diz Max. A
estratégia dos recrutadores para detectar as invencionices é levar a
entrevista a um nível de detalhe extremo, para capturar
contradições.
5. Motivo de desligamento - Se percebida, a mentira sobre os motivos
da saída de empregos anteriores desperta a impressão de que o
candidato quer esconder algo. Demissões nunca são bem vistas. Mas
hoje, com a rotatividade tão alta, deixaram de ser um estigma. Mesmo
assim, devem ser explicadas. Se o desligamento foi espinhoso, o
melhor é demonstrar maturidade, assumir eventuais maus passos e
mostrar que o episódio serviu de lição. Jogar a culpa no ex-chefe é
tentador, mas o efeito é quase o mesmo de um pedido para desistir do
processo de seleção.
6. Datas de entrada e saída de empregos - Esticar em alguns meses
a permanência no emprego anterior pode ser até aceito pelo
selecionador, para quem tem vergonha de dizer que estava
desempregado. “Mas a manipulação de datas é intolerável quando ela
tenta esconder um padrão de permanências curtas nos empregos”,
afirma Vander Giovani, da Kroll. Uma ou duas passagens curtas podem
ser devidas a dificuldades de adaptação, diz Giovani. Mais que isso
é sinal de instabilidade e falta de habilidades sociais. “Há aqueles
que nem sequer colocam experiências curtas para não destacar essa
instabilidade”, afirma Carlos Eduardo Dias, da Asap. “Essa omissão é
imperdoável.” E facilmente constatada por checadores, ao ligar para
empresas ou observar a carteira de trabalho.
7. Endereço - Muitos candidatos mentem em relação ao local de
moradia por três motivos: imaginam que morar perto pode facilitar a
contratação; acreditam que morar em um bairro mais pobre prejudique
suas chances; ou tentam obter uma verba maior de vale-transporte.
Nos dois primeiros casos, é uma mentira menos ofensiva, mas também
não vale a pena. Quando for descoberta pela checagem do comprovante
de residência ou pela visita de um colega, ela vai despertar
desconfiança do empregador.