Novo sistema para recolher ICMS confunde microempresa
Carlos Eduardo Dias, proprietário de uma pequena loja de material
de construção na região central da capital paulista, se desdobrava
para atender a telefonemas de clientes e para tentar resolver um
problema no funcionamento de um recém-adquirido equipamento para
emissão de notas fiscais. Boa parte dos produtos vendidos por Dias
estão, desde o início do mês, sujeitos a uma nova forma de
recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS). O pequeno empresário, porém, ainda não tinha idéia da
repercussão que a mudança pode trazer a seu negócio e planejava à
noite, ir a uma reunião no sindicato do setor, o Sincomav, para
"descobrir" os efeitos da mudança.
Ele mantinha algumas gôndolas de sua loja vazias porque resolveu
deixar a compra de alguns itens metais e materiais elétricos para um
segundo momento. "Os preços subiram 5%, em média. Quero saber hoje
na reunião se essa elevação está certa e se eu terei mesmo de
comprar os produtos com esse aumento." Dias é proprietário de uma
loja num universo de micro e pequenas empresas que respondem
atualmente por 78% do faturamento global dos varejistas de material
de construção na região metropolitana de São Paulo. O setor de
materiais de construção foi um dos alcançados pela ampliação da
substituição tributária de ICMS implementada pela Fazenda paulista.
Por esse regime, a indústria antecipa o imposto que seria pago
durante toda a etapa de comercialização do produto, até a venda ao
consumidor final.
A antecipação do imposto tem como alvo a sonegação no varejo e
teoricamente não deveria resultar em aumento de carga tributária.
Mas para tributaristas e sindicatos ouvidos pelo Valor, a elevação
de carga pode atingir os micro e pequenos empresários que hoje pagam
ICMS pelo Supersimples, sistemática em que esse segmento recolhe
vários tributos ao calcular um determinado percentual sobre o
faturamento. Os percentuais variam por tributo e de acordo com a
faixa de faturamento.
Não é somente no segmento de materiais de construção que os micro
e pequenos empresários têm importante participação no setor
varejista. Segundo a Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio),
esses pequenos são responsáveis por 41,3% do faturamento do setor
varejista no país. No varejo de alimentos, que também entrou na
substituição em maio, a participação é de 60%.
Em muitos casos, explica a advogada Fernanda Possebon Barbosa, o
pagamento de uma alíquota sobre faturamento é mais interessante do
que o cálculo da alíquota de ICMS sobre o que é, na prática, a
margem de lucro. Isso porque as alíquotas sobre faturamento, que
variam de 1,25% a 3,95%, são bem menores do que o imposto, de 18% na
regra geral.
Uma simulação foi feita pelo escritório para uma mercadoria que
sai da fábrica a R$ 112,68 e tem agregada uma margem de 40%. Levando
em conta que a venda é direta da indústria para o varejista, o ICMS
a ser recolhido pelos critérios do Supersimples por uma microempresa
com faturamento de até R$ 120 mil seria de R$ 1,97. Para uma pequena
empresa com faturamento anual na faixa dos R$ 2,28 milhões a R$ 2,4
milhões, o ICMS seria de R$ 6,23. Dentro da substituição tributária,
porém, esses varejistas pagarão sua parte do ICMS embutida no preço,
num recolhimento que será de R$ 9,08.
Ou seja, tanto a faixa mínima como a faixa máxima poderão ter
elevação de carga tributária. A simulação leva em consideração que o
ICMS antecipado será calculado exatamente com margem de 40%. "Isso
tende a acontecer porque os produtos da substituição tributária
perdem o benefício do Simples e tem o ICMS recolhido na regra
geral", explica Fernanda.
Otávio Fineis, coordenador de administração tributária da
Secretaria da Fazenda de São Paulo, explica que o objetivo da
substituição tributária não é elevar a carga. Ele diz que a margem
praticada deve fazer diferença na conta. "Alguns varejistas que hoje
recolhem o ICMS do Supersimples com base num percentual muito
pequeno do faturamento podem ter aumento de carga. Alguns terão
aumento e outros, redução. Na média, o resultado não deve mudar",
diz Fineis. "A Fazenda está aberta para discussão de margens com as
entidades que representam esses micro e pequenos varejistas."
O assessor econômico da Fecomércio, Noboru Takarabe, diz que a
mudança deve trazer efetiva elevação de carga tributária e
provavelmente o aumento de custo repercutirá nos preços. Por
enquanto a federação não tem uma proposta para neutralizar os
efeitos da elevação de carga nos micro e pequenos, mas pretende
solicitar à Fazenda uma forma diferenciada de recolher o ICMS sobre
os estoques. Pelas normas da substituição, as mercadorias adquiridas
antes da entrada do regime devem ter o ICMS recolhido levando em
conta as margens de cada produto. Mesmo parcelado, porém, o
pagamento desse imposto pode afetar o fluxo de caixa dos varejistas.