Ex-sócios derrubam na Justiça penhoras de contas bancárias
Ex-sócios de empresas que respondem a processos trabalhistas
estão conseguindo na Justiça liberar contas bancárias penhoradas
eletronicamente, por meio do Sistema Bacen Jud. Juízes estão
aceitando o argumento de que o Código Civil limita a
responsabilidade do executivo ao período de dois anos de sua saída
da sociedade. Um ex-sócio, que teve R$ 200 mil penhorados de sua
conta, conseguiu recuperar a quantia alegando que já estava fora da
sociedade há oito anos. "Como a legislação trabalhista é omissa em
relação à responsabilidade do ex-sócio, nos baseamos no Código
Civil", diz a advogada Juliana Assolari, sócia do Gandelman
Advogados, que o representa no processo.
Desde 2001, empresas e pessoas físicas que respondem por dívidas
na Justiça correm o risco de terem seus saldos bancários bloqueados
eletronicamente, graças ao Sistema Bacen Jud, criado pelo Banco
Central (BC). O programa permite consultas, penhoras, desbloqueios e
transferências de recursos de contas bancárias. De janeiro a maio,
foram registradas 644,7 mil ordens para liberar recursos apreendidos
em processos judiciais.
Advogados que são procuradores de sociedades estrangeiras
instaladas no Brasil também estão conseguindo derrubar as penhoras
on-line. Sócios de escritórios de advocacia costumam ser contratados
por empresas estrangeiras para assinar contratos ou outros
documentos em nome da companhia. Quem assina não o faz como alguém
que participa da gestão, mas como representante do sócio
estrangeiro. "É comum os juízes decidirem apenas com base na
indicação nominal das pessoas constantes na ficha de breve relato
emitida pela Junta Comercial, sem atentar para a condição específica
de cada um dos citados nessa ficha, sócio, administrador ou
procurador", afirma o advogado Luis Antônio Ferraz Mendes, sócio do
Pinheiro Neto Advogados. Para provar isso ao magistrado, junta-se o
contrato social da empresa e a procuração que demonstra quais são os
poderes específicos do procurador.
Quando a empresa entra em falência, e não são mais encontrados
ativos, a penhora on-line de sócios é ainda mais usual. Isso em
razão da teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Em um
caso do escritório TozziniFreire, um empregado do chão de fábrica
ajuizou reclamação contra a empresa falida para receber verbas
trabalhistas que não lhe foram pagas. O juiz bloqueou a conta
bancária do diretor de marketing da empresa. "Provamos que ele não
teve relação com a má gestão da companhia, embora tivesse trabalhado
lá na mesma época que o funcionário", diz o advogado da banca,
Marcelo Gômara, que representa o diretor no processo. Foram juntadas
provas como a ata da assembleia que o nomeou, estatuto da empresa
que mostra quais são os poderes de cada diretor e a ata que
registrou sua saída da empresa, antes da demissão do funcionário
reclamante.
A penhora de patrimônio de "terceiro", que não é citado como
parte na ação trabalhista e nem tem relação jurídica com o
trabalhador, também alcança cooperados. Um grupo de trabalhadores de
uma indústria falida adquiriu máquinas da empresa e criou uma
cooperativa de produção. Seus antigos colegas de trabalho foram à
Justiça contra a empresa e alegaram que a cooperativa seria sua
sucessora. O juiz acatou a tese e bloqueou as contas dos cooperados.
"Demonstramos a constituição regular da cooperativa e que não havia
nenhuma relação entre a nova sociedade e os sócios da falida para
liberar as contas", explica a advogada Daniela Beteto, do escritório
Trevisioli Advogados, que defende os cooperados no processo.
Obtido o desbloqueio na Justiça, advogados reclamam da demora
para a volta do dinheiro para a conta bancária. "Isso leva cerca de
60 dias", afirma o advogado Paulo Sergio João, sócio do Mattos Filho
Advogados. Já o Banco Central afirma que o procedimento, via Bacen
Jud, leva 48 horas. Basta o juiz fazer o pedido de desbloqueio até
às 19 horas, que até às 23h30 o BC envia a ordem aos bancos .
Novo código exigirá notificação prévia
Uma das maiores críticas dos advogados em relação à penhora
on-line de contas bancárias é a falta de notificação de ex-sócio ou
diretor, para que possa ser feita uma defesa prévia. A situação, no
entanto, pode mudar com o novo Código de Processo Civil (CPC), em
tramitação no Senado desde o início de junho.
De acordo com o juiz Jansen Fialho de Almeida, um dos
participantes da comissão que elaborou o anteprojeto, com a
aprovação das alterações no CPC, o sócio deverá ser chamado antes da
penhora on-line para se explicar. "Isso evitará a penhora indevida",
diz. Apenas se houver risco do sócio desaparecer ou dilapidar seus
bens, o juiz poderá bloquear imediatamente a conta. "Só se o
trabalhador provar que o executivo está alienando ou transferindo
seus bens para parentes, ou, ainda, se tiver muitas ações contra si,
a medida será justificada."
O juiz Guilherme Guimarães Feliciano, membro da Comissão
Legislativa da Associação Nacional de Magistrados da Justiça do
Trabalho (Anamatra), afirma que o juiz trabalhista deve com maior
agilidade satisfazer a demanda, junto aos ex-sócios ou à empresa que
sucedeu a falida, por ela ser geralmente de natureza alimentar, ou
seja, urgente. "Primeiro, o juiz verifica quem eram os sócios na
época. Cabe ao interessado demonstrar que, nesse período, não tinha
participação na gestão da empresa", afirma. (LI)
